Embora não fosse esperada uma decisão unânime como nas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), o placar de 5 a 4 a favor de um corte de 0,25 ponto percentual anunciado hoje – menos intenso do que as reduções de 0,50 p.p. nas últimas reuniões – recebeu bastante atenção pelos economistas devido ao que essa divisão pode significar sobre os próximos passos da autoridade monetária.
O motivo é que todos os votos pela manutenção do ritmo vieram de diretores indicados pelo governo Lula, cabendo aso diretores remanescentes do antigo governo o papel mais duro (“hawk”) do encontro. Assim, ficou nítida a preferência deles por juros mais baixos, que alguns interpretam até como possível leniência em relação à inflação.
Além disso, foi citada a mensagem final de que a política monetária política monetária “deve se manter contracionista” e que “a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”. Essas afirmações deixaram claro que o BC não pretende colocar o trabalho já feito em risco, o que pode desagradar à ala “governista” do colegiado.
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Em live da XP e do InfoMoney no Youtube, Caio Megale, economista chefe da XP, comentou que o Copom tinha sido claro na reunião passada de que nesta reunião de maio haveria condições para um corte de 0,5 ponto percentual, mas que o cenário ficou diferente, especialmente porque mudou a expectativa de cortes na taxa de juros nos EUA, o que afetou a taxa de câmbio por aqui.
“A taxa estava entre R$ 4,80 e R$ 4,90 e foi lá para R$ 5,30. Hoje, voltou para algo em torno de R$ 5,10”, diz Megale, lembrando as commodities também subiram e que a demanda interna se mostrou muito aquecida.
Assim, o próprio presidente do BC passou a alertar sobre a dificuldade de manter o ritmo pelas mudanças, uma linha seguida por outros diretores em suas comunicações recentes. Mas o diretor Gabriel Galípolo, por sua vez, alertou que não deveria se embaraçar na volatilidade de curto prazo.
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é por isso que, no entender de Megale, já nas sinalizações entre os “Copoms” era possível captar essas visões diferentes, espelhadas na divisão de votos hoje. “Isso é natural num ambiente de Banco Central independente. Tem decisões divididas nos Estados Unidos muitas vezes, no México e em outros países, com diretores mostrando uma cabeça diferente”, compara.
Também convidado da live, Fernando Ferreira, estrategista-chefe e head do research da XP, concordou com a opinião de Megale, mas alertou que, do ponto de vista dos mercados, o dissenso deve embutir algum prêmio de risco no curto prazo, pela maior incerteza em relação à política monetária em 2025, quando o BC estará sob nova gestão.
Cenário pior
Para Leonardo Costa, economista da ASA Investments, o Copom mostrou um reconhecimento de um cenário inequivocamente pior do que na reunião de março, com a atividade doméstica mais quente, um quadro externo pior por conta de inflação nos EUA – e sem sinal de corte de juros -, além da desancoragem da expectativa doméstica.
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“A principal mudança foi a elevação da preocupação em relação ao mercado externo, com a política de juros nos Estados Unidos sendo a maior adversidade exposta na reunião de maio. A despeito de se manter equilibrado, o balanço de riscos indica aumento da incerteza na conjuntura internacional”, comentou.
Costa citou que, na projeções, o modelo do BC indicou um IPCA de 3,8% em 2024 (ante expectativa anterior de 3,5%) e 3,3% em 2025 (de 3,2%), portanto ambos os anos fora da meta de 3%.
Daí veio a mudança adicional no comunicado, que passou a reconhecer que a expectativa de inflação está desancorada, sendo que antes se referia como “parcialmente desancorada”, destacou o economista da ASA.
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Sobre a divisão de votos, Costa avalia que é melhor esperar pelo tom da ata da reunião na semana vem para tentar entender melhor onde está a divergência dentro do BC.
O cenário da ASA Investments é de mais 3 cortes de 0,25%, com a taxa Selic terminal chegando a 9,75% ao final do ano.
Risco de leniência?
Já o economista da Rio Bravo, Luca Mercadante, analisa que o ambiente mais incerto no exterior e o cenário fiscal brasileiro fizeram com que BC fosse “contra” a comunicação anterior e decidisse cortar menos os juros do que o sinalizado, embora isso já estivesse precificado pelo mercado.
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Mais importante até do que as mudanças na comunicação, segundo ele, foram os votos divergentes do Copom. “Pela segunda vez na história temos 4 votos divergentes no comitê, sendo que os diretores divergentes foram todos os indicados pelo atual governo. A visão de que os novos diretores são mais lenientes com a política monetária pode gerar uma pressão para o juro longo, dando ainda mais importância para a decisão do presidente”, afirmou.
Claudia Moreno, economista do C6 Bank, lembra que aqueles que votaram a favor do corte de 50 pontos-base foram os membros mais novos do comitê, que foram indicados pelo presidente Lula, incluindo Gabriel Galípolo, que é visto como um possível sucessor de Campos Neto.
“Essa divisão aí na decisão de juros pode sinalizar que esse grupo de integrantes, de diretores que foram indicados pelo presidente Lula, podem ter uma tendência maior a reduzir mais os juros”, advertiu.
Roberto Padovani, economista chefe do Banco BV, por sua vez afirma que a decisão do BC faz sentido, uma vez que há um quadro de expansão fiscal e o mercado trabalho apertado pressiona a inflação, , especialmente de serviços, o que desencora as expectativas. “A gente esperava que essa cautela, no entanto, acontecesse a partir da próxima reunião, mas como houve uma oportunidade de mercado, o BC antecipou sua estratégia”, explicou.
Mas a outra leitura importante, segundo Padovani, é que essa foi uma decisão dividida e os quatro diretores indicados pelo presidente da República votaram por um corte de 0,5 ponto. “Isso, de certo modo, revela as preferências do próximo Banco Central.”
Para Marcelo Bolzan, sócio da The Hill Capital, o dissenso dentro Copom é ruim, pois sinaliza que a próxima composição do BC, a partir de 2025, é mais “dovish”. “Outro destaque é que o comitê afirma ter preocupação com o fiscal e que está acompanhando com atenção os desenvolvimentos recentes da política fiscal. Eles ressalta, também que uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação.”
Vinicius Moura, economista e sócio da Matriz Capital, diz que o tom do comunicado pode ser interpretado como “cautelosamente hawkish”. “Ainda acredito que o Fed mantendo juros altos pode atrapalhar no ciclo de queda de juros por aqui. Juros altos nos EUA podem fortalecer o dólar e pressionar a inflação, dificultando a redução da Selic.
Eventos como as enchentes no Rio Grande do Sul podem pressionar a inflação de alimentos, dificultando a queda também”, comentou.
Vinicius Romano, especialista em Renda Fixa da Suno Research, destaca outra mudança importante, que foi o fato de a autoridade monetária ter retirado o “forward guidance” de seu comunicado, em função da elevação das incertezas e da sua busca de maior flexibilidade.
Para Tatiana Pinheiro, economista chefe de Brasil da Galapagos Capital, houve surpresa na quantidade de votos a favor de manter o ritmo de 50 pontos base de corte, mas apesar desse grande dissenso, o comunicado foi duro. “O cenário externo foi definido como mais adverso, a atividade econômica local como mais forte que o esperado e a inflação subjacente acima da meta”, listou.
Além disso, Tatiana destacou que a autoridade monetária lembrou a importância da credibilidade fiscal para a política monetária. “Por fim, de forma lacônica retirou o ‘forward guidance’ e a vinculação do ciclo ao balanço de risco, assumindo que as decisões futuras serão ditadas pelo objetivo de convergir a inflação à meta. No penúltimo parágrafo explicitou que está dependente da evolução das expectativas de inflação e do cenário global.
Sobre esse dissenso, Marco Antonio Caruso, economista chefe do Pic Pay, chamou a atenção para o fato de que o comunicado não trouxe nenhum argumento dos dissidentes. “Está claro que o melhor lugar para trazer essa discussão é a Ata. Mesmo assim, chama a atenção não haver um contraponto sequer, além dos que já existiam no passado, como os de uma inflação corrente mais baixa”, disse.
Para Caruso, isso vai alimentar a discussão do mercado sobre a possibilidade de que o futuro Comitê, após a saída do presidente Roberto Campos Neto, poderá ser um Copom inclinado a menos juros.
Já Luis Cezário, economista chefe da Asset 1, afirmou ser possível que os agentes considerem que a política monetária nos próximos anos passará a mirar um intervalo entre a meta e o teto da banda, o que faria com que as expectativas de inflação caminhassem em direção ao teto da meta (4,5%) ao longo do tempo. “Se isso ocorrer, há o risco do debate sobre a adoção de uma meta de inflação mais elevada ressurgir em algum momento.”
Fonte: InfoMoney