Aprovada no ano passado, a Reforma Tributária voltou ao radar com o primeiro projeto de lei para regulamentar os impostos sobre o consumo chegar ao Congresso Nacional. O sistema de tributação vai mudar para um formato de Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual – serão dois impostos que vão unir, de um lado, três tributos federais e, do outro, um estadual e um municipal.
Essa divisão já havia sido definida na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criou a reforma – agora, a lei complementar definiu quais grupos de produtos terão regimes de cobrança diferenciados. Alguns setores e categorias profissionais terão isenções completas, descontos ou regimes específicos de tributação.
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A reforma deve ser sentida em diversos setores da economia e, consequentemente, da Bolsa brasileira. Para alguns, os impactos devem ser positivos – é o caso, segundo o Bradesco BBI, de agricultura, alimentação, distribuição de combustíveis, infraestrutura de transportes, construção civil de baixa renda, entre outros.
Entre as empresas com impacto neutro estão o setor financeiro em geral, telecomunicações, farmacêutico, papel e celulose, e transmissão e geração de energia. Já o impacto negativo recairá sobre bebidas, educação, mineração, petróleo, aluguel de carros, shoppings, entre outros. Confira a situação de cada setor:
Setor financeiro
Não deve haver mudanças importantes para o setor financeiro, segundo o Bradesco BBI. A Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) deverá manter a mesma proporção atual – ou seja, a nova taxa não deverá mudar a carga tributária. Do lado positivo, haverá maior padronização e normalização de cobranças entre estados e municípios, o que poderá facilitar o cálculo dos impostos.
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Já do lado operacional, a proposta é que os contribuintes informem e paguem os impostos no momento da venda, mesmo nos pagamentos parcelados – de forma semelhante a uma dedução do salário. Assim, a complexidade das operações de cobrança e liquidação realizadas pelas empresas de pagamento ou software (ERP) no momento da venda poderá aumentar neste novo cenário.
Agricultura e alimentos
Os insumos agrícolas (fertilizantes, sementes, defensivos agrícolas e outros) são elegíveis a uma redução de 60% no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e na CBS, o que é positivo para a SLC Agrícola (SLCE3), 3Tentos (TTEN3) e AgroGalaxy (AGXY3). Os produtos agrícolas frescos, incluindo a carne, também se beneficiam. A carne processada, porém, deve pagar a taxa integral do IBS/CBS.
Há uma primeira leitura positiva para JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3) e Minerva (BEEF3). M. Dias Branco (MDIA3) deverá se beneficiar da inclusão de farinhas e massas entre os produtos elegíveis ao desconto de 60% na alíquota do imposto.
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Bebidas
As bebidas alcoólicas estão sujeitas a IS (Imposto Seletivo, ou “imposto sobre o pecado”), cujo a alíquota ainda não foi determinada, mas será baseada no teor alcoólico dos produtos. A tarifa não deve mudar materialmente no caso da cerveja, diz o BBI, mas aumentará para outras bebidas.
Refrigerantes, energéticos e outras bebidas açucaradas também deverão estar sujeitas ao IS. O “imposto sobre o pecado” das bebidas alcoólicas já tanto antecipado, mas a inclusão das bebidas açucaradas foi uma surpresa negativa, trazendo uma leitura negativa para Ambev (ABEV3), diz o banco.
Varejo
Não há mudanças importantes para o varejo discricionário, tendo carga fiscal teórica reduzida (de 30% a 40% para 26% a 27%) em comparação com a tributação mais elevada do setor dos serviços. Porém, há riscos potenciais: exceções e tratamentos especiais, além de eliminação do incentivo fiscal de ICMS em 2033.
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Esses mesmos pontos também se aplicam aos produtos básicos de varejo, o que tende a ser marginalmente positivo para as empresas. A “cesta básica” de bens alimentares tem 15 itens com imposto zero, contra 8% em média; se o Governo optar pela lista de prioridades (bens saudáveis e acessíveis), outros 27 itens da cesta básica contarão com redução de impostos de 15,8% a 10,6%; o custo dos alimentos pode ser reduzido para a população de baixa renda.
Saúde
A Reforma Tributária é vista como mista para as empresas de saúde listadas, com impacto negativo nos lucros da Rede D’Or (RDOR3) da Hapvida (HAPV3), devido a um potencial aumento na carga tributária; e impacto neutro para os prestadores de serviços. As empresas, principalmente a Hapvida, poderiam compensar os impostos potencialmente mais altos através de aumentos de preços.
No setor farmacêutico, a previsão é de maior carga tributária para drogarias e menor para Hypera (HYPE3) e, principalmente, Viveo (VVEO3). O impacto pode ser neutro, dado o potencial repasse da mudança nos impostos para os preços dos medicamentos regulados pela CMED. Benefícios fiscais de ICMS serão mantidos por meio do Fundo Compensatório.
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Educação
Para companhias do setor educacional, o impacto é visto como negativo considerando o potencial aumento na taxa de impostos (hoje muito baixos para o segmento principal de graduação) pelo BBI. No setor, a expectativa é que a Anima (ANIM3) seja mais afetada, considerando sua margem líquida mais baixa. Mesmo assim, a necessidade de aumento de preços para compensação seria mais baixa que em outros setores.
Combustíveis
O setor de distribuição de combustíveis será o mais beneficiado a partir de 2027, diz o BBI, quando começará a tributação monofásica para o etanol e o querosene de aviação. A tributação sobre os combustíveis será cobrada em forma de imposto monofásico (que ocorre apenas no montante da cadeia produtiva) e como imposto ad-rem com valor fixo em reais por litro, que já é o modelo utilizado para a gasolina, GLP e diesel. Além disso, as importações de combustíveis através da Zona Franca de Manaus não serão elegíveis para isenções fiscais.
O principal benefício é que a evasão fiscal para o etanol deverá cair drasticamente – já que enquanto a margem bruta da gasolina é de quase R$ 150/m³, a do etanol está mais próxima de R$ 80/m³ por causa da evasão fiscal. O projeto de lei, portanto, é muito positivo, pois deverá ajudar a reduzir a informalidade e a concorrência ilegal no setor, além de ajudar a aumentar as margens da indústria a longo prazo, ajudando também os intervenientes legais a recuperar participação de mercado.
Por outro lado, a produção de petróleo está incluída nos segmentos que devem pagar o imposto seletivo – e este imposto será de até 1%, cobrado sobre o preço do petróleo. Portanto, na prática, funciona como somar 1% ao royalty que é cobrado hoje – no caso das empresas menores, as taxas de royalties hoje estão próximas de 10%. Como resultado, vê um impacto negativo, mas mínimo, pois incluindo um royalty adicional de 1% (a taxa final pode ser inferior a isso) nos nossos modelos de petrolíferas, o impacto não é superior a 5%).
Siderurgia, Mineração e Papel e celulose
O impacto é ligeiramente negativo relacionado com a criação do Imposto Seletivo, mas vê a eliminação do artigo 19 da proposta anterior (que estabelecia que cada estado teria discricionariedade sobre a taxa de imposto proposta) como muito positiva. Atualmente o setor está sujeito aos impostos IRPJ, CSLL e PIS/COFINS – mas o setor siderúrgico também está sujeito ao IPI, enquanto o setor de mineração está sujeito à CFEM (até 3,5% sobre a receita bruta) e ao TFRM. Para papel e celulose, a visão é de impacto neutro.
Transportes e bens de capital
É esperada uma potencial redução dos impostos sobre o valor acrescentado nos investimentos em infraestrutura, pois a proposta deverá isentar o setor do IVA sobre o investimento. Em determinados projetos, o governo estadual pode conceder esse incentivo fiscal. Espera uma economia de investimentos de aproximadamente 7% – a Rumo (RAIL3), por exemplo, já garantiu esse benefício para os projetos de Lucas do Rio Verde e Malha Norte. O programa REPORTO para estimular investimentos no setor portuário foi incorporado na Reforma Tributária também. O aluguel de equipamentos para obras de infraestrutura é isento de impostos, mas o Governo Federal incluiu um imposto seletivo sobre as vendas de carros novos – que não gerará créditos fiscais. Esta nova alíquota ainda não foi definida e apenas os veículos totalmente elétricos terão isenção do IS. Enquanto isso, haverá um IVA presumido para contratação de caminhoneiros independentes, sendo que a JSL (JSLG3) e outras empresas de logística deverão ter crédito fiscal para contratar caminhoneiros independentes utilizados em seus contratos, awndo positivo. Por fim, aponta uma redução de 40% nos impostos para a aviação regional. Além disso, o setor aéreo, bem como outras empresas que tenham combustível como insumo, terão créditos fiscais sobre os custos de combustível.
Em bens de capital, o REINTEGRA deveria voltar com isenção total de impostos para as receitas de exportação. As exportações estão isentas de IVA e o Governo Federal terá até 270 dias para compensar ou pagar esses créditos tributários. Além disso, a indústria de defesa deveria estar isenta de IVA, o que seria positivo para a Embraer, por exemplo.
A estimativa é de um impacto líquido negativo de um dígito para os shoppings, mas ainda com muitas peças móveis – a situação atual é de, aproximadamente, 7% de imposto sobre a receita bruta. A nova proposta é 21,5% (desconto de 20% sobre o IVA de 26,5%) sobre as rendas menos reduções baseadas no valor dos bens. Do lado positivo, (i) os contratos de arrendamento determinam que o aumento do imposto seja integral e automaticamente repassado aos inquilinos na sua renda mensal, assim descontos de aluguel serão discutidos caso a caso; (ii) os shoppings poderão reduzir a base tributária em 1/360 do valor patrimonial/mês, além de outros custos específicos que também poderão reduzir o IVA; e (iii) os inquilinos sob o regime fiscal de lucro real poderão obter créditos fiscais (de 80 a 85% dos inquilinos segundo a nossa estimativa). Do lado negativo, (i) os inquilinos sob o regime fiscal do simples nacional não serão capazes de compensar impostos mais elevados, levando a custos de ocupação mais elevados e (ii) o impacto semelhante para todos os shoppings (alguns pontos base no faturamento, o que significa um impacto de um dígito no FFO). A Multiplan deverá ser um pouco menos impactada, mas, no final, acreditamos que o impacto deverá ser bastante semelhante para todos os players.
Para construtoras, a visão é ligeiramente positiva para as operações de baixa renda, mas ligeiramente negativa para os demais segmentos. Na situação atual, as empresas pagam 2% sobre a receita bruta (RET). Na nova proposta haverá uma taxa de imposto de 21,5% (desconto de 20% sobre o IVA de 26,5%) sobre a receita bruta, menos uma série de deduções, sendo que o impacto do novo imposto mudará de acordo com o preço unitário da venda. Como resultado, as unidades no segmento de média/alta renda deverão ter um aumento material no imposto sobre a receita bruta, exigindo preços mais elevados (entre 4 e 8%, em nossos cálculos) para sustentar as margens.
Fonte: InfoMoney